quinta-feira, 25 de abril de 2013

Carta do Prelado do Opus Dei

Caríssimos: que Jesus guarde as minhas filhas e os meus filhos!

Ainda são muito recentes os momentos de grande importância de que fomos testemunhas na vida da Igreja: a eleição de um novo Romano Pontífice. Como acontece  sempre nestes eventos, pudemos experimentar a ação do Paráclito e o que Bento XVI afirmava ao iniciar o ministério petrino: “A Igreja está viva; esta é a maravilhosa experiência deste dias (...). A Igreja é jovem. Traz em si mesma o futuro do mundo e, portanto, indica também a cada um de nós o caminho para o futuro. A Igreja é jovem, e nós assim o vemos: experimentamos a alegria que o Ressuscitado prometeu aos seus” [1].

Com uma grande alegria, unidos a toda a Igreja, todas e todos na Obra acolhemos a eleição do Papa Francisco, que trouxe consigo uma rajada de espiritualidade, de anelos de melhora. A festa de São José, dia em que o novo Pontífice deu início solene ao seu ministério de Pastor supremo da Igreja universal, tornou especialmente tangível a percepção de que o Senhor, a sua Mãe Santíssima e o santo Patriarca velam pela Igreja em cada momento; de que a Esposa de Cristo nunca está só no meio das vicissitudes e flutuações que encontra no decorrer da sua existência.

De que modo vive José a sua vocação como custódio de Maria, de Jesus, da Igreja?, perguntava o Papa Francisco. E respondia: Com a atenção constantemente voltada para Deus, aberto aos seus sinais, disponível para o seu projeto e não tanto para o próprio; é o que Deus pede a Davi (...). Deus não deseja uma casa construída pelo homem, mas a fidelidade à sua palavra, ao seu desígnio; quem constrói a casa é o próprio Deus, mas com pedras vivas marcadas pelo seu Espírito. José é “custódio” porque sabe escutar a Deus, deixar-se guiar pela sua vontade, e precisamente por isso é ainda mais sensível às pessoas que lhe foram confiadas; sabe como ler com realismo os acontecimentos, está atento ao que o rodeia, e sabe tomar as decisões mais sensatas [2]. Como já vos fiz notar antes da eleição e vo-lo confirmei depois – seguindo em tudo o nosso Padre –, já queremos ao novo Papa com imenso afeto sobrenatural e humano, ao mesmo tempo que procuramos apoiar – com abundante oração e mortificação – os primeiros passos do seu ministério, sempre importantes.

Ontem começou o tempo pascal. O aleluia cheio de júbilo, que sobe da terra ao céu de todos cantos da terra, manifesta a fé inquebrantável da Igreja no seu Senhor. Jesus, após a sua afrontosa morte na Cruz, recebeu de Deus Pai, pelo Espírito Santo, uma nova vida – uma vida plena de glória na sua Humanidade Santíssima –, como confessamos aos domingos num dos artigos do Credo: o mesmo Jesus – perfectus homo, homem perfeito – que sofreu a morte sob Pôncio Pilatos e foi sepultado, esse mesmo Jesus ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras [3], para nunca mais morrer e como penhor da nossa ressurreição futura e da vida eterna que esperamos. Digamos, pois, com a Igreja: Na verdade, é justo e necessário, é nosso dever e salvação dar-vos glória sempre, Senhor, mas mais solenemente neste tempo em que Cristo, nossa páscoa, foi imolado. Ele é o Cordeiro de Deus que tirou o pecado do mundo: morrendo, destruiu a morte, e, ressuscitando, restaurou a vida [4].

Procuremos aprofundar, com a ajuda do Paráclito, neste grande mistério da fé, sobre o qual se apoia – como o edifício sobre os seus alicerces – toda a vida cristã. “O mistério da Ressurreição de Cristo – ensina o Catecismo da Igreja Católica – é um acontecimento real que teve manifestações historicamente comprovadas, como atesta o Novo Testamento”[5]. São Paulo explicava-o aos cristãos de Corinto: Porque eu vos transmiti em primeiro lugar o mesmo que recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras; foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras; e apareceu a Cefas e depois aos doze [6].

O caráter total excepcional da ressurreição de Cristo consiste em que a sua Humanidade Santíssima, uma vez reunidos de novo a alma e o corpo pela virtude do Espírito Santo, foi completamente transfigurada na glória de Deus Pai. É um fato histórico certificado por testemunhas plenamente críveis; mas é, ao mesmo tempo e sobretudo, objeto fundamental da fé cristã. O Senhor, “no seu corpo ressuscitado, passa do estado de morte para outra vida, além do tempo e do espaço. Na Ressurreição, o corpo de Jesus enche-se do poder do Espírito Santo; participa da vida divina no estado da sua glória, de tal modo que São Paulo pôde dizer de Cristo que Ele é o «Adão celeste» (cf. 1 Cor 15, 35-50)”[7].

Meditemos no que São Josemaria escreveu numa das suas homilias: Cristo vive. Jesus é o Emanuel: Deus conosco. A sua Ressurreição revela-nos que Deus não abandona os seus (...).

Cristo vive na sua Igreja. “Digo-vos a verdade: a vós convém que eu vá, porque, se não for, o Consolador não virá a vós; mas, se for, eu vo-lo enviarei” (Jo 16, 7). Tais eram os desígnios de Deus: Jesus, morrendo na Cruz, dava-nos o Espírito de Verdade e de Vida. Cristo permanece na sua Igreja: nos seus sacramentos, na sua liturgia, na sua pregação e em toda a sua atividade.

De modo especial, Cristo continua presente entre nós nessa entrega diária que é a Sagrada Eucaristia. Por isso, a Missa é o centro e a raiz da vida cristã. Em todas as missas está sempre o Cristo total, Cabeça e Corpo.
Por Cristo, com Cristo e em Cristo. Porque Cristo é o Caminho, o Medianeiro; nEle encontramos tudo; fora dEle, a nossa vida torna-se vazia. Em Jesus Cristo, e instruídos por Ele, atrevemo-nos a dizer
audemus dicere Pater noster, Pai nosso. Atrevemo-nos a chamar Pai ao Senhor dos céus e da terra.

A presença de Jesus vivo é a garantia da sua presença no mundo [8].

Jesus ressuscitado é também o Dono do mundo, o Senhor da história: nada acontece sem que Ele o queira ou permita em função dos desígnios salvadores de Deus.  São João no-lo apresenta no Apocalipse em toda a sua glória: No meio dos candelabros [vi] alguém semelhante ao Filho do homem, vestido com uma túnica até aos pés e o peito cingido por um cinto de ouro. A sua cabeça e os seus cabelos eram brancos como lã cor de neve, os seus olhos como chamas de fogo, os seus pés semelhantes ao metal precioso incandescido na fornalha, a sua voz como o estrondo de muitas águas. Segurava na mão direita sete estrelas, da sua boca saía uma espada afiada de dois gumes, e o seu rosto era como o sol quando brilha em todo o seu esplendor [9].

Esta soberania de Nosso Senhor sobre o mundo e sobre a história em toda a sua amplitude exige de nós, seu discípulos, que nos empenhemos com todas as nossas forças na edificação do seu reino na terra. Uma tarefa que requer não só que amemos a Deus com todo o coração e toda a alma, mas que amemos com uma caridade afetiva e efetiva, com obras e de verdade [10], cada um dos nossos semelhantes, particularmente os que estão mais necessitados. Por isso, compreende-se muito bem – escreveu São Josemaria – a impaciência, a angústia e os anseios inquietos  daqueles que, com alma naturalmente cristã (cf. Tertuliano, Apologético, 17), não se resignam perante as situações de injustiça pessoal e social que o coração humano é capaz de criar. Tantos séculos de convivência entre os homens, e ainda tanto ódio, tanta destruição, tanto fanatismo acumulado em olhos que não querem ver e em corações que não querem amar [11].

            Esta é, como sabeis, uma das preocupações que o novo Papa manifestou desde os primeiros momentos do seu pontificado. Impelidos pelo exemplo e pelos ensinamentos do nosso Padre, continuemos a esforçar-nos por levar a caridade de Cristo, a solicitude espiritual e material pelos outros, ao ambiente em que cada qual trabalha; de modo pessoal, mas também procurando e pedindo a urgente colaboração de outras pessoas que manifestam esta preocupação pelos necessitados. Não esqueçamos nunca que o Opus Dei nasceu e se reforçou, por querer divino, entre os pobres e doentes dos bairros periféricos de Madri; e a eles o nosso Fundador se dedicou com generosidade e otimismo, com grande emprego de tempo, nos primeiros anos da Obra. Em 1941, escrevia: Não é preciso recordar-vos, porque assim o viveis, que o Opus Dei nasceu entre os pobres de Madri, nos hospitais e nos bairros mais miseráveis: e continuamos a atender os pobres, as crianças e os doentes. É uma tradição que nunca se interromperá na Obra [12].

Poucos anos depois, São Josemaria completava este ensinamento com outras palavras bem claras que, apesar do tempo decorrido, conservam plena atualidade. Neste tempo de confusão – escrevia –, não se sabe o que é direita, nem centro, nem esquerda, no campo político e no social. Mas se por esquerda se entende conseguir o bem-estar para os pobres, a fim de que todos possam satisfazer o direito de viver com um mínimo de conforto, de trabalhar, de estar bem atendidos se adoecem, de distrair-se, de ter filhos e poder educá-los, de ser velhos e ser atendidos, então eu estou mais à esquerda do que ninguém. Naturalmente, dentro da doutrina social da Igreja, e sem compromissos com o marxismo ou com o materialismo ateu; nem com a luta de classes, anticristã, porque nestas coisas não podemos transigir [13].

Doía especialmente ao nosso Fundador ver que o desamor e a falta de caridade com os indigentes também se dava às vezes entre os cristãos:

Os bens da terra, repartidos entre poucos; os bens da cultura, encerrados em cenáculos. E, lá fora, fome de pão e de sabedoria; vidas humanas – que são santas, porque vêm de Deus – tratadas como simples coisas, como números de uma estatística. Compreendo e partilho dessa impaciência, levantando os olhos para Cristo, que continua a convidar-nos a pôr em prática o mandamento novo do amor.

Todas as situações que a nossa vida atravessa trazem uma mensagem divina e pedem-nos uma resposta de amor, de entrega aos outros [14].

Minhas filhas e filhos, meditemos nestas palavras e façamo-las ressoar nos ouvidos de muitas pessoas, a fim de que o mandamento novo da caridade brilhe na vida de todos e seja – como Jesus queria – o distintivo de todos os seus discípulos [15]. Quereria que aprofundássemos na frase que se lê no Evangelho após o relato da ressurreição de Jesus: Gavisi sunt discipuli viso Domino [16], os discípulos encheram-se de alegria ao verem o Senhor. Consideremos também que o Mestre nos segue sempre de perto, e temos que descobri-lo, de olhá-lo, nas circunstâncias extraordinárias e ordinárias da vida corrente, convencidos daquilo que São Josemaria afirmava: ou o encontramos aí, ou não o encontraremos nunca. Por isso, será que, com o triunfo de Cristo, com a certeza de que Ele conta conosco, demos um novo rumo ao nosso gaudium cum pace, à nossa alegria cheia de paz? Tem essa alegria conteúdo sobrenatural e humano?

Ao longo deste mês, a par do júbilo da Igreja pela Páscoa e por ter de novo um sucessor de Pedro na terra, acrescentam-se no nosso caso outros motivos de alegria: especialmente os aniversários da Primeira Comunhão e da Confirmação de São Josemaria no dia 23. Que boa ocasião para que, nas próximas semanas,  peçamos ao Senhor, por intercessão do nosso Padre, a luz abundante e a fortaleza do Espírito Santo para o Papa Francisco, para a Igreja Santa, para a humanidade! Não vos escondo que me dá muito gosto percorrer a história do Opus Dei, a história das misericórdias de Deus, e peço à Trindade Santíssima que o mesmo suceda com todas e com todos: não vivemos de recordações, mas da alegria de ver a mão de Deus no caminho percorrido pela Obra, na vida de São  Josemaria.

Com todo o afeto, abençoa-vos

                                                               o vosso Padre

                                                               +Javier

Roma, 1º de abril de 2013.

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